Sobre Adriana Nogueira

Bailarina, pesquisadora e educadora em arte/dança. Cursa pedagogia na Universidade de São Paulo. Está envolvida com o tango desde 2010, onde atuou como Bailarina, professora e organizadora de milongas em São Paulo. Faz parte da organização do projeto Tango na Rua desde o fim de 2012. Formada em dança pela Escola Técnica de Artes de São Paulo. Trabalha também com dança contemporânea e intervenções urbanas.

“Entre los que quieran”

Foi ali!
sim foi, naquele instante.
um espelho refletiu a maior verdade..
verdade?
vixe…. isso não existe
isso é crença besta
corda bamba que a gente se segura
vez ou outra
pra dar coragem pra vida.

depois, ali na varanda, se vê que verdade mesmo é “uma doença de nossas ideias”
como já disse o poeta.

já me falaram de patologia social…
não gosto de pensar nisso.
Gosto de sentir
e me perceber sem os rótulos farmacêuticos…

afinal sou esta aqui, sem qualquer roupagem fantasiosa…
eu com meus medos, meus anseios, minhas verdades…

Doa a quem doer,
veja a quem quer ver.

sou esta aqui, quer ver?

Por que decidi que de agora por diante só vou ser convidada.
Abrir a minha vida vai ser tarefa árdua.

Vou proteger-me com muito carinho…
vou me enfiar, enrolada, nessa coberta quentinha,
neste travesseiro macio.

vou ouvir a chuva solitária e ter saudades aos montes.

mas não vou correr desesperada

vou viver com calma

pra não sair tanto do script,
vez ou outra vou me entregar a uma paixão fresca.

Mas agora to de casamento marcado,
vai ter festa sem fim.

Quem quiser vir, tá convidado!
deu trabalho tecer tudo isso, vixe, suor danado.
mas a decoração tá bonita, o sabor e os sorrisos são garantidos.

A minha casa tá posta e necessita de gente empenhada,
Gente cheia de medos e anseios e verdades….
mas, a exigência é que tudo isso possa ser vivido
Sem tanta decência…mas com o sorriso de quem aceita a responsabilidade.

É, quero pessoas responsáveis!
pessoas donas de si mesmas e que queiram visitar essa minha casa.
Por que a minha casa eu levo pra tudo quanto é canto…
carrego a bichinha, as vezes pesa que nem saco de batata…
as vezes flutua, voa…

Mais é minha, e de mais ninguém…
e ela tá aberta a visitação, viu?
mas saiba que ao tratar de seu alicerce…
eu sou a única responsável.

 

Um elogio a caretice OU Manifesto Romântico (humano) OU Curriculum Mortis

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Um elogio a caretice Ou Manifesto Romântico (humano) Ou Curriculum Mortis

Venho através deste comunicar o meu cansaço
Sim!
Cansei minha alma de tantos cálculos e conjunturas

Insistentemente me dizem: viva o agora como se não houvesse o amanhã e muito menos o ontem.

Para mim isto nada mais é que: seja um indivíduo sem história

Se não fosse suficiente
Também são descrentes do amor

Olham-me cheios da condolência robusta de gente esperta e controlada

Ultimamente quis seguir estes caminhos
Viver o agora e o desamor

E o que me sobrou?

Um vazio
Um vazio sem fim

Era como se faltasse cem anos para coisa nenhuma

Era uma corrida interminável

Sem sentido

A grande vantagem eram as gargalhadas

Recuperei-as desavergonhadamente
Soava por vezes ridículo
Mas se o mundo podia acabar no próximo instante… qual o problema?

Mesmo assim
A felicidade que gritava alto e em bom tom não durava muito
O maxilar não aguentava ser tão feliz
Doía

E o amanhã insistia em aparecer e o ontem estava sempre ali perto da porta

E o mundo e coisas dele insistiam em querer amor

No fim, ou em algum momento, cansei de ser essa atleta burra
Afinal, se for pra correr [fugir] que seja da morte e não da vida anunciada..

Por isso eis aqui o meu manifesto:

NÃO AO “VIVER O AGORA”
NÃO A VIDA SEM SONHOS
NÃO A BANALIZAÇÃO DO AMOR
NÃO AS DISTÂNCIAS INTRANSPONÍVEIS
NÃO AOS MAL ENTENDIDOS
NÃO AOS ENSIMESMAMENTOS

tudo deu errado

Quase todas as minhas projeções, vontades e querências.

Não importa!

Minha teimosia é continuar acreditando bobamente
Minha guerra é a vida
Manter meus pulmões abastecidos
E o sangue circulando

No mais continuarei:

Boba de amor
Boba de histórias
E, principalmente,
Boba de sonhos.

Terreno úmido e ruidoso

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Volto com o corpo revirado,
doído, marcado.

Viagem,
normalmente,
mexe com mente.
Este lugar de ocupação das idéias.

Recife, Pernambuco
me pegou forte.
Arrebatador, sem frescura
só cura.

O tambor ressoou fundo dentro
Batalha ganha com o pulso.
O corpo quente
Da febre, da gente
Da cana, engana?

Só sei que a raiz fincou com espaço, receosa, mas vistosa.
O medo ficou no concreto.

O gosto aveludado do rio Capibaribe, insessante, querendo ganhar a pele, o sangue.

Maracatu de esquina, beira.
Beirou a febre, tímida.

Dentro desembrulhou
Do quente, estridente, viu-se gente.

O sol acabrunhado de avenida apossou o espírito.
Vívido de carne
Foi só músculo.

Geralmente penso em osso
duro de roer
geral mente
sem sente
sente
ente
permanente
doente
ente
em te
ti
só ti

A transcendência está no é
é aqui na matéria,
no pensamento
na união
no chão
ão
trovão.

 

Recife- PE
30 de agosto de 2014

sem muito saber, me rendendo as palavras que vêm

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Encaminhando neste mundo
Corpo a corpo com o desconhecimento de mim

Eu que amo!
Eu que quero!

(Sabendo que querer não é suficiente
Nem amar talvez seja)

O importante mesmo é a convenção

O que já está meio caminho andado é dica do universo
É caminho de quem quer conforto

Risco é rasgar se por algo que não se sabe
Algo sem garantia

Riscar se de ser o que o coração pede
Esse senhor sem ponderação

Sem mente
Semente daquilo que brota lá
Aqui sabe?

Esse lá que é dentro da gente
Nosso mais que parece tão descrente
Tão distante

Viajamos de nos mesmos
Para que depois de se cansar bastante

voltamos
Seguimos o profundo
O lá que é aqui
Que sempre estava aqui

Essa casa da gente
Que não tem lugar fixo não

É andarilho
É viagem

É um lugar que vai junto com a gente pra onde a gente quiser ou tiver que ir

De repente
O que não se pode garantir fica sendo a nossa única garantia para os outros,
a nossa única real honestidade.

Amor de si emprestado

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Amor
Ingênuo amor
Pobre criança temerosa
Que teima
E teima
Até queimar os miolos
Nó cego do juízo
Sem lei
Sem rei
Só servidor

Deite na cama
E fique
Espreguice
Descanse da loucura
Aproveite a noite
O dia de não ter obrigação
Só ter o outro
Sem planos
Desfrute

Viva esta tensão
Do que é e do que pode ser
Lhe dou a mão,  as coxas e o sorriso
Olho nos teus olhos
Em busca de explicação
Viajo em mim

Me permite?
Usar uma pouco do teu universo para saber mais sobre o meu
Sou um pouco lenta neste assunto
Preciso de alguém para me botar a parte desta mulher que sou

Sei que não é meu
E o mistério de si é o que nos enlaça
Me perco um pouco dentro de vc, mas sempre buscando a mim
E retorno, sempre há o retorno
A volta a si

E isso é egoísta
Sempre vai ser
E é bom que seja

voltar a semear

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Volto com a sensação de vida
Uma inquietude certa de algo que achei que não sabia

Escrevi em algum lugar sem um devido porquê
“estou prestes a descobrir algo”

E tentando encontrar qualquer coisa menos este algo ai
Continuo sem saber
Mas ando desconfiada
Um pé atrás
Aqui ponho um tanto de peso meu

Peso de vida
Não toda vida
Um tanto só
Só que já é grande
E nem sozinho é
É um só mais de sol do que de lua
Em sonho antigo

Pescado por esta sensação de viagem sem chão
Me veio um delírio de algo

Algo aqui
Estou no Piauí
Aqui, seria lá, aqui do lado
No Ceará
Este algo, que ando visitando
Virou um pedaço de chão que ando pisando

As vezes vou pra cima, mas normalmente
O mais seguro é só um leve apoio
Com maciez e textura
É um contato que vive em tensão de virar ponte
Vínculo

Uma fome que não se deixa saciar
Quando tem comida não tem colher
Quando tem talher a comida tá fria
Há algo no vácuo
Sem resposta…

No entanto
As suas mentiras me levaram a uma verdade que não conhecia
Me fez buscar algo que não sabia bem
Algo meu
Minha semente fermentada no mundo
Que não é de ninguém, que veio de mim
Sai de mim e sempre volta

Família

 

Tia Carolina

31 de maio de 2014
Rio de Janeiro – São Paulo

Tia Carolina

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No caos da dúvida
no inferno mental do desconhecido
há um lugar meu ai
um cantinho quente
permanente

Ali, isento os culpados
adormeço as dores com gengibre, limão e açucar queimado
acalmo a febre com batatas
clamo benções com a cruz de alecrim
massageio forte as tripas, desevirando o bucho
fico em silêncio, oro
lanços os ramos no meio fio
e retorno

O amor não é egoísta
não pode sê-lo
ele não mede
não pode ser exato, não tem segundos e nem horas
ele têm pulso
arritmia existêncial
do ser em ser
do medo de perder
do medo

ê, que ai perde
causa febre
vira o bucho
traz mal agoro
mal se olha
olha se mal
se mal, olha
olha-se, mal
Molha-se

Sinto o cheiro do alecrim
da senhora solene
do semblante terno
Agora é só lembrança
mas que muito cedo me ensinou curas cheirosas
e logo mais tarde me ensinou a dor
o peso da morte
e tudo isso ainda paira em mim
no meu caminho chei(r)o de alecrim.

Lágrimas para a terra

“Rosa é flor feminina que se dá toda e tanto que para ela só resta a alegria  de se ter dado.”

Clarice Lispector em Água Viva

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“Como flor
fui me podando.
Tal qual a asa que se desfaz do papagaio de gaiola.
fui me fazendo bonita
aos olhos de outros.
Fui podando minha selvageria, meus excessos.
me fui fazendo o que se espera.
Refiz-me no corte, para evitar esbanjamentos.
contive a vida selvagem…
canalizei meu córrego…
E aprendi a ser doente.”

Adriana Nogueira 14 de janeiro de 2014

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Na cidade há

Na cidade há muita tendência a solidão.

Para todo problema se constrói um muro.

E para cada muro que se ergue

se esvai todas as possibilidades de vida, de família.

A família, esta instituição… agora se fala até em multa.

Se multa por não fechar o portão

Tem pena, tem castigo…

Não tem olho, não tem coração

Justiça?

Qual?

O justo é o que ajusto no meu espaço

é aquilo que fica perifericamente situado na ideia de que tenho de felicidade.

Felicidade?

A anestesia pegou forte.

Não não sinto dor, não, não sinto.

Adormeci em meus sentidos, fechei a janela do quarto..

O vento só sabe é desfazer meu cabelo

Vivo no limbo, meus pés já sufocaram

As palavras só me servem como o adoçante…

Elas simulam o sabor doce,

Mas não há açúcar de verdade

Não há

haaaa

O que há?

Eu

Eu há no mundo

Os outros?

Estão lá no “há” deles

Na cidade há muita tendência para solidão

Amor em Fernando Pessoa

 

“(…)
Quando te vi amei-te já muito antes:
  

Tornei a achar-te quando te encontrei.  
Nasci pra ti antes de haver o mundo.  
Não há cousa feliz ou hora alegre  
Que eu tenha tido pela vida fora,  
Que o não fosse porque te previa,  
Porque dormias nela tu futuro.  
……………………………………………………………  
E eu soube-o só depois, quando te vi,  
E tive para mim melhor sentido,  
E o meu passado foi como uma ‘strada  
Iluminada pela frente, quando  
O carro com lanternas vira a curva  
Do caminho e já a noite é toda humana.  
……………………………………………………………  
Quando eu era pequena, sinto que eu  
Amava-te já longe, mas de longe…  
……………………………………………………………  
Amor, diz qualquer cousa que eu te sinta!  
— Compreendo-te tanto que não sinto,  
Oh coração exterior ao meu!  
Fatalidade, filha do destino  
E das leis que há no fundo deste mundo!  
Que és tu a mim que eu compreenda ao ponto  
De o sentir…? 
(…)”

Se lê mais aqui: http://www.revista.agulha.nom.br/fpesso50.html